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Traduza-me em sua língua e versifique-me em tua boca.Sinho Livre

O pirilampo e a lua


- Ei, pequenino! O que fazes perdido na escuridão da noite que te envolve e te confunde? - perguntou a Lua ao pirilampo que ali passava.
- Não estou perdido - respondeu o pirilampo com a calma de um santo. - Estou a caminho de casa.
- Mas parece um pouco confuso, sabes realmente para onde ir? - insistiu a Lua.
- Não te preocupes comigo, sei muito bem para onde vou.
- Tudo bem, apenas percebi que a luz que tu geras é pouca para iluminar o teu caminho - sorriu ironicamente a Lua.
- Sempre me esforço para encontrar o caminho de volta para minha casa, mas sempre me vejo resguardado em meu lar no fim da busca - replicou o inseto luminoso.
- Ah, ah, ah... - deu-se a rir como uma dama louca a Lua. Ee acrescentou:
- Tenho pena de ti, pois saibas que trago comigo tanta luz, tanta luz, que sou capaz de iluminar toda a Terra e o "caminho de volta para casa" de todos os seres que nela vivem.
- Alguma única vez supliquei teu socorro? Saiba, dona Lua, mentes para si num aspecto...
- Qual? - perguntou ansiosa a Lua, querendo saber porque mentia.
- Não iluminas toda a Terra, aapenas uma parte dela é banhada pelo teu véu lunático. A outra parte dela é iluminada pelo senhor Sol.
- Mas lá também hei de chegar no momento crepuscular do irmão Sol - disse a Lua.
- Mas quando lá estiveres, aqui faltarás - riu e devolveu a irônica observação o pirilampo.
- O que queres dizer com isso? Que não passo de uma farsa? - indagou, solicitando uma explicação honrosa a Lua. E proferiu em voz alta... - Saiba, inseto, que todos os homens me adoram, os amantes me veneram, os navegantes se orientam por mim. Tenho deuses que carregam meu nome, os mares se agitam por minha causa, assim como suas ondas e marés.
- Estás equivocada novamente em parte. Parece que vives do passado. Os marinheiros tem ao seu dispor tecnologias novas, não precisam erguer os seus olhares para ti, se não apenas para apreciar teu brilho artificial. E se ainda existem deuses que carregam teu nome, eu os desconheço, pois oro a um único Deus, e este não se chama por "Lua".
A lua, nesse instante, já estava com o semblante de quem forjaria uma guerra para se sobrepor às ideias do pequeno inseto.
- O que pensa que tu és? Não passa de um inseto... De um candelabro que insiste em iluminar sozinho uma mansão povoada por seres que necessitam de tua luz. Porém, não tem luz suficiente para todos. És uma fagulha de luz no corredor da vida, sem capacidade de iluminar todos os vãos da mesma. És apenas um pequeno inseto que se esforça todas as noites para encontrar o caminho de volta para sua casa - esbravejou a lua.
- Como já lhe disse antes, nunca supliquei seu socorro. Não por orgulho próprio, mas por jamais necessitá-lo realmente, pois a luz que gero é suficiente para o que ambiciono.
- Ah, ah, ah.... - riu a Lua. E disse, em tom de escárnio... - Eis aqui, bem diante de mim, mais um romântico sem ambição.
- Não me importam os teus pensamentos. És para mim tão importante quanto a escuridão que me acerca ao entardecer. Me fazes lembrar o quão tenho que brilhar. E outra coisa tenho a te falar, cara amiga...
- Diga... diga logo... Tenho mais o que fazer que escutar tuas asneiras...
- Saiba, dona Lua, que as nuvens escuras jamais diminuem meu brilho, pelo contrário, me fazem ainda mais luminoso. Pois fazem diminuir o teu.
A lua já estava possessa nesse instante e quando tentou uma nova reação, foi logo interrompida pelo bravo inseto, que disse:
-Ah!!!!! Não foi eu quem iniciou tal discussão banal e fútil, que não mudarás jamais a minha vida. Reconheço sua grandeza, cara amiga Lua.
A Lua espantada, sorriu soberana diante do reconhecimento do tal inseto, de sua superioridade luminária. Mas o pirilampo não havia cessado ainda, foi apenas interrompido. Então, tomou de volta para si a discussão com o desejo de encerrá-la vencedor. E logo providenciou as palavras finais do embate:
- Diga-me, amiga Lua... O que seria de ti se o irmão Sol se apagasse um dia?
A lua estranhou a pergunta, pois tinha a certeza de que tal profecia jamais se cumpriria, e quando se prontificou a responder, foi interrompida pelo "nano" inseto.
- Deixe que eu respondo por ti - a Lua ficou ansiosa para ver o desfecho da tal hipótese profética levantada pelo pirilampo, que concluiu:
- Se o Sol se apagasse um dia... a única luz que teria refletida na tua superfície pálida e fria seria a luz artificial dos homens. Gerada por suas tecnologias. A mim, restaria brilhar soberano pelos prados e florestas sem luz, pois a pouca luz que crio e gero é minha, é própria.... E não refletida dos outros seres ou astros.
O pirilampo deu as costas à quilométrica esfera e deixou-a sozinha com seus lamentos e injúrias proferidos, esperando assim tê-la convencido de que não é preciso ter muito na vida para ser feliz. Não que tenhamos de satisfazermo-nos com pouco, mas se esse "pouco" é teu e te faz feliz... contenta-te então com ele.